Ela usava aquela mesma saia de quando se conheceram, cheia de flores coloridas e desenhadas, que ele tanto gostava. Ela não gostava muito porque se sentia um jardim desenhado por uma criança, e quando disse isso a ele, ele respondeu que ela era o jardim mais lindo que ele já tinha visitado - daquele jeito risonho antipático, horrível, tão doce. A blusa não era a mesma, optou por usar uma preta, simples assim, porque o que ela ia fazer era desse jeito mesmo, simples assim, pronto acabou. O esmalte das unhas estava desgastado, era verdade; perdera tanto tempo roendo e arrancando o esmalte vermelho que, quando viu, já era hora de sair e não tinha acetona em casa. O cabelo tinha mudado de lado, porque mulher é assim, muda o cabelo quando muda de vida, ou não, vai saber. Ele demorava, como sempre, e ela esperava ansiosa como sempre, porque o cabelo mudou e a vida também, ou não, mas eles continuavam os mesmos. E talvez fosse isso que tornava a coisa toda tão detestável: por serem os mesmos e terem mudado ao mesmo tempo, ou por não terem mudado mas não serem mais quem são. Não era simples como uma blusa preta.
Então ele chegou, andando sempre daquele jeito "não estou nem aí pra nada", mas isso não era verdade. Ele estava aí para ela, ele estava aí para a roupa que ela usava, e ele estava aí pra reparar que ela não tirou o esmalte desgastado - um erro, um vacilo, porque ele a conhecia bem e sabia que ela faria de tudo pra esconder qualquer demonstração de ansiedade e/ou de preocupação. "Falhou", ele pensou. Andava como se fosse o dono da calçada, e no entanto não pisava tão firme, talvez porque ela sempre enfeitou o cara como se ele fosse um deus caminhando pelas nuvens, e era assim que ele se sentia - não um deus, mas sim alguém que só pisava em nuvens brancas e gordinhas quando estava com ela. Era ela, a garota dos sonhos dele, escondida numa saia de flores, num esmalte vermelho, num cabelo partido para o outro lado ("Ela acha que mudou, mas não mudou nada"), parada como se não se importasse em esperar, mas odiando-o por deixá-la esperando.
Os dois se olharam, se encararam por uns segundos, e nisso pesou aquele clima de novela sensacionalista e mexicana: como deveriam se cumprimentar? Ela podia correr pros braços dele? Ele podia abraçá-la pela cintura? Eles trocariam um beijo apaixonado e jurariam continuar juntos? Ela colocaria o cabelo dele para trás da orelha e alisaria seu queixo? Ele deveria sussurrar as boas e velhas promessas no ouvido dela? O que um deveria falar para o outro? Deveriam dizer todas as sensações pelas quais passavam agora? Todos os pensamentos loucos, insanos, desesperados, que fluiam nas mentes de cada um? Todas as vontades, tantas!, muito mais do que todas as descrições desse texto? E por que não faziam nada? Por que não quebravam esse suspense, por que não terminavam logo com isso, já que a situação era uma blusa preta no meio de uma loja de roupas floridas nas nuvens?
- Pronto. Acabou.
Então os dois foram embora e nunca mais se viram.
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2 comentários:
os finais deviam ser sempre simples...
por que quase nunca são né?
Bonito.
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